segunda-feira, 12 de dezembro de 2022

DESAFIOS E RECEIOS DA EDUCAÇÃO FORMAL INDIGENA NO BRASIL

 



Para a grande maioria dos povos indígenas, a transmissão dos saberes ancestrais acontece todos os dias na convivência dos povos nas aldeias, a grande escola de vida que prepara homens e mulheres para dar continuidade às tradições de seu povo. Porém desde que os primeiros europeus chegaram ao continente há mais de 500 anos, os povos indígenas que sobreviveram ao massacre físico foram vítimas de um tipo diferente de massacre: cultural e espiritual. As missões religiosas trouxeram novos modos de vida, novas crenças e hábitos a centenas de povos diferentes. Os jesuítas criaram escolas para civilizar e domesticar os índios. Até hoje, evangelistas principalmente norte-americanos traduzem o Novo Testamento em línguas indígenas, impondo suas crenças e modo de vida a essas populações.

Até pouco tempo, pensava-se que os povos indígenas deixariam de existir como culturas distintas e se integrariam à sociedade nacional. Isso começou a mudar no final dos anos 1970 e início dos anos 1980 com a organização do movimento indígena e a Constituição. De acordo com a Constituição brasileira de 1988, o direito à terra e ao seu modo de vida, bem como à educação e capacitação diferenciadas, são garantidos por lei. Em 1991, a responsabilidade pela educação indígena formal foi transferida para a Fundação Nacional do Índio FUNAI, que chegou a um acordo com várias missões religiosas sobre a responsabilidade do MEC, e uma nova fase de resoluções e diretrizes do governo começou a tratar dessa complexa questão, com escolas em áreas indígenas.

Se o país já luta para educar uma população brasileira que fala a mesma língua e vive de forma mais ou menos parecida, imagine como seria lidar com uma diversidade de mais de 230 etnias, mais de cento e oitenta idiomas e realidades e expectativas muito distantes. Segundo o censo de 2008, cerca de 2.700 escolas indígenas nos 26 estados da Federação são reconhecidas no país, com mais de 2.500 alunos matriculados no ensino fundamental e médio. Mas como são essas escolas? onde eles estão? Como eles estão organizados? O que esses professores e alunos querem? Até o final dos anos 80, muitas comunidades aborígenes não tinham escolas formais e não queriam ter uma. A percepção deles sobre a educação formal é muito negativa, principalmente porque a educação recebida ainda está relacionada à missão religiosa.




Muitos pais não permitem que seus filhos frequentem a escola porque acreditavam que as salas de aula limitam as crianças a uma idade em que deveriam estar livres e com a família e amigos para aprender o básico da vida e das tradições. Como os professores não eram indígenas, eles não falavam a língua da aldeia. Desconheciam as tradições, os modos de vida e os ritmos comunitários. Esses pais temiam que seus filhos perdessem contato com sua cultura e valores, embora acreditassem que é importante que os jovens aprendam português e matemática para se comunicar com os brancos e proteger os interesses da comunidade. Muitas vezes, deixavam os filhos aos cuidados de amigos de confiança para que os filhos pudessem estudar na cidade, mas sempre sob supervisão de familiares e idosos da aldeia.
Hoje, formar índios como professores e gestores em escolas em terras indígenas é um dos principais desafios e prioridades na consolidação da educação escolar indígena pautada nos princípios da diferença, especificidade, bilinguismo e intercultural, e implementando os fundamentos da educação como ferramenta pela afirmação étnica e promoção de projetos voltados para a sustentabilidade das comunidades aldeãs por meio da formação de professores indígenas. Para ensinar, é preciso ter conhecimento dos temas abordados.




Dessa forma, é necessário que os professores não só das escolas indígenas, mas em geral tenham um conhecimento profundo dos povos indígenas, pois os livros didáticos falam muito pouco sobre os povos indígenas, a história de luta, os preconceitos, a determinação e as conquistas.
O universo educacional indígena se volta para a sua própria realidade, verificando que os professores possuem formação oferecida pelo governo estadual e que mesmo diante das dificuldades que emergem diariamente, a escola mantém um currículo diversificado voltado para a asserção étnica dos cursos, e busca por meio de mecanismos próprios, estudar ações que promovam o fortalecimento de sua cultura nativa.

Confira agora o podcast!

No podcast de hoje, vamos entrevistar Ymara (@

ymaraguajajara

) que é da aldeia buritirana de Grajaú-Maranhão, aldeia dos indígenas Guajajara. Ymara faz Cinema e Audiovisual na Universidade Federal do Pará. O objetivo dessa entrevista é tentar entender a importância das escolas indígenas sob o olhar dos povos indígenas.

https://soundcloud.com/user-646364957/entrevista-sobre-a-educacao

sexta-feira, 12 de agosto de 2022

O NEGRO NO SÉCULO XIX SOB O OLHAR DE RUGENDAS


Trabalharemos aqui o uso fontes imagéticas para o ensino História indígena e afro-brasileira. Nele, discutiremos as relações culturais, sociais, econômicas e políticas dos grupos afro-brasileiros e indígenas. Trabalhando mais especificamente com as pinturas do artista Johann Moritz Rugendas, que colocam em destaque esses dois grupos em meio ao Brasil do início do século XIX.

Levando em conta o contexto da obrigatoriedade do ensino do ensino da história indígena e afro-brasileira para os alunos da educação básica (Leis 10.639/03 e 11.645/08). Essa deliberação decorre de uma necessidade de conhecer mais sobre os grupos, uma vez que eles e seus costumes fazem parte da cultura e da sociedade brasileira. Desta forma, a análise de imagens é uma forma muito rica de trabalhar a história indígena e afro-brasileira. Há um grande número de documentos imagéticos de diferentes abordagens, provenientes de diferentes regiões e de diferentes épocas, refletindo as características e situações vivenciadas por esses grupos. Em geral, as vantagens do uso de fontes iconográficas na classe vão além das possibilidades do documento textual comum e dão maior força para atravessar o abismo que existe entre a pesquisa acadêmica e a educação básica.

A palavra iconografia vem da palavra grega eikonographía, onde – eikon significa “imagem” e – graphía significa “descrição/escrita”; assim, etimologicamente, pode-se dizer que é uma descrição ou escrita sobre uma imagem. No entanto, o termo está intimamente relacionado à história da arte.

Neste estudo, escolhemos primeiramente um recorte temporal, o século XIX, com base na produção historiográfica, sabemos que nos primeiros séculos foram muitas as situações de representação: contato linguístico, expedições de exploração dentro do país, mercado de produção e circulação, o ciclo da riqueza, revoltas populares, guerras coloniais, escravidão, etc. Desta forma, por meio da iconografia, saber se, em determinadas imagens, alguma dessas situações surgiu como evidência histórica. Nos concentramos aqui apenas em um pintor e algumas de suas obras, afim de realizarmos uma análise mais qualitativa e detalhada das pinturas selecionadas.

Johann Moritz Rugendas


Foi um pintor alemão que visitou o Brasil duas vezes: Primeiro, como desenhista de uma missão científica liderada por Georg Heinrich von em 1821 Langsdorff (1774-1852), pouco depois, em 1845, para visitar um velho amigo, além disso, de alguma forma "curtir" seu sucesso entre a elite brasileira.

Em sua primeira visita, chegou ao Rio de Janeiro em 3 de março de 1822, e seu primeiro destino foi a Fazenda da Mandioca, localizada no interior do Rio de Janeiro, propriedade e reduto de Langsdorff para importantes pesquisas agrícolas. É de lá que surgem os primeiros trabalhos sobre escravidão e trabalho livre, e a vida cotidiana na cidade. Rugendas vê o Brasil muito além de sua flora e fauna "exóticas". Acompanhado por todo o frenesi político no Brasil desde setembro de 1822 Assistiu a uma realidade social desconhecida: cativeiro negro, navios negreiros, travessia desembarques de escravos, mercados de escravos, cenas de tortura e até registros da sensualidade das mulheres negras africanas em solo brasileiro.

Escravos de Cabinda, Quiloa, Rebola e Mina


Quatro diferentes nações compõem a prancha acima, estão representados: Cabinda, Quiloa, Rebola e Mina. Esta última se destaca pelos tatuagem em todo corpo. O negro Cabinda, cuja ilustração limita-se a cabeça também traz marcas no seu rosto. Já negra Rebolla, é a que aparenta ter mais idade. O intuito de utilizar esta ilustração é mostrar aos estudantes e discutir com eles a diversidade de povos africanos que foram trazidos para o Brasil como escravos.

Jogar Capoeira, 1835


Rugenda apresentou a cultura de negros e índios como minorias. Esta tela mostra uma luta de capoeira usada pelos negros para se defender. No entanto, essa luta teve que ser transformada em uma dança para que as autoridades não os oprimissem. A maioria dos que o faziam, encontrava-se trabalhando em áreas urbanas, vendendo seu trabalho e os produtos produzidos nas fazendas de seus senhores, mostra a madeira anterior, e que sua presença nas cidades era grande, assim como no campo. Essa tela também serve como ferramenta para o professor discutir com seus alunos sobre a cultura afro e as formas de resistência negra na sociedade escravista brasileira.

Casa dos Escravos


Com esta ilustração, podemos confrontar a ideia de que os escravos não tinham família, que todos os escravos estavam sujeitos a senzalas, onde eram amarrados sem vínculos, apenas liberados para o trabalho. Interessante abordamos o papel da mulher como dona de casa, falamos sobre as famílias escravas, estimulamos os alunos a terem consciência do que resta, da separação quando você vê uma mulher negra em um barraco e a Senhora da casa grande que é a proteção da peito de sua luxuosa casa. Através da obra discutirmos em sala que não era apenas a luta ou a fuga uma forma de resistência, mas havia certos "direitos" que eram obtidos através da luta, greves de fome, negociação e resistência. Entre esses direitos estão o direito de ter casa própria, folga ou fazenda para morar e, além disso, ter uma forma de obter sua liberdade.

Rua Direita, 1835


Nesta obra podemos ver o fluxo comercial na cidade do Rio de Janeiro. Os negros fazem vários trabalhos como carpintaria, sapataria, alfaiataria e até mesmo trabalham como marinheiros e vendas em geral. Esses negros que iam para as cidades eram obrigados a vender seus empregos ou produtos agrícolas para conseguir dinheiro em troca. No entanto, esse dinheiro foi destinado ao seu senhor, o escravo possui uma pequena parte desse capital. Ou ainda, muitos eram livres para vender seu trabalho na cidade, sob a condição de pagar uma certa quantia em dinheiro ao seu senhor. Foi com essa renda que, muitas vezes, poucos conseguiram comprar sua liberdade.


Negras do Rio de Janeiro 

Importante expormos imagens com a presença de mulheres nesta obra, vemos duas mulheres negras fazendo transação envolvendo a compra de adereços femininos. A que está em pé, comprando - uma negra vendedora de frutas - carrega filho às costas à maneira africana. A prática de carregar filho às costas era bastante disseminada na África e em toda Afro-América. Ela permitia à mulher negra - cuja família muitas vezes era composta por apenas mãe e filhos - ter mais autonomia em suas atividades cotidianas. 

De fato, a história contada através da iconografia nos traz muito sobre a cultura e o modo de vida, tanto dos escravos quanto da aristocracia brasileira do século XIX. Dessa forma, eles nos ensinam que uma obra de arte, não importa o que seja, é um texto que pode ser olhado em sala de aula, e interpretado de acordo com os valores e a moral da época em que foi produzida, pois acrescenta outro ponto de vista. Podemos concluir que Rugendas mostrou formas, beleza, cultura, trabalho, entre outras categorias, à sua maneira e que contribuiu à sua maneira para a preservação da memória e da história do Brasil.


 Confira agora o podcast!

No podcast de hoje vamos entrevistar a Professora da rede Municipal de ensino de Marilena, Irah de Assis, que é uma ativista do movimento negro da região. Falamos sobre a aplicabilidade da lei 10639/2003, sobre a importância das cotas raciais e também sobre alguns eventos realizados em Marilena que ela esteve a frente. 

https://soundcloud.app.goo.gl/Apcf1zk2zUdH8uwH6